Julie & Julia e o prazer de encontros inesperados! :-)

Como já comentei alguns posts atrás, tomei a "decisão-de-antes-do-ano-novo" de ir mais ao cinema.Como toda vez que me decido firmemente a fazer alguma coisa, me jogo de cabeça, tronco e membros! Lá ia eu rumo ao cinema qdo encontro uma amiga pelo caminho.Coincidência extrema pois,além de nenhuma morar no bairro onde nos encontrávamos,estávamos ambas com tempo livre.



Depois de alguns percalços ( a bilheteira nos deu ingresso para a sessão errada) e algumas compras depois ( por parte dela), nos acomodamos satisfeitas em poltronas de localização ideal no cinema quase vazio, ó glória! Uma amiga em comum havia tecido comentários efusivos sobre o filme e tendo relação com a culinária francesa dificilmente seria, pra mim, um filme completamente ruim.Com a Meryl Streep ainda por cima, uma decepção absoluta seria pouquíssimo provável.Assim como no filme da Chanel, sou pra lá de suspeita pra avaliar friamente o filme.


Já no iniciozinho não pude me impedir de participar de uma risada coletiva dos espectadores ( sendo a minha catártica) qdo se vê a chegada de Julia Child à Paris, onde se instalaria com o marido diplomata em missão abençoada de 4 anos.Um Francês diria que ela estava " aux anges", mas um carioca diria, com precisão absoluta,que ela mais parecia um " pinto no lixo", tamanha a felicidade estampada em seu rosto, sua voz e atitude.

Enfiei a carapuça no último quando vi Julia de cestinha de vime em punho fazendo suas comprinhas -não nas Galerie Lafayette como seria mais óbvio-mas numa daquelas irresistíveis ruas de paralelepípedos de Paris, com lojas de comida para todos os lados e bancas ( de comida!) ao ar livre! E cheias de vendedores de avental para interagir, conversar sobre comida (!!!)....Nesse momento, o narrador- o marido diplomata de Julia- diz algo parecido com :" apesar do famoso mau-humor dos parisienses, Julia, com seu bom-humor e entusiasmo, era capaz de converter até o pior dos brutamontes...". E na tela se via Meryl Streep caracterízadíssima como americana dos anos 40/50, com um sorriso de orelha a orelha tentando, num Francês claudicante, se comunicar com os vendedores aparentemente sensibilizados por tamanho interesse culinário por parte de uma estrangeira.Ainda mais uma americana.(E aí não é juízo de valor meu, mas do Francês-médio.Claro que existem americanos amantíssimos da cultura e culinária francesa, mas não é isso que o Francês-médio espera.)


Até me irrito um pouco, confesso, com essa fama horrível do mal humor Francês e sobretudo parisiense.Em suas defesas, tenho alguns argumentos:

1.Aqueles mal-humorados com quem os turistas topam em Paris não são, em sua maior parte, parisienses.

2.Qq habitante de cidade grande altamente turística tem direito ao mal-humor.
A vida nas grandes cidades, seja Rio ou Paris, não é propriamente repousante...nem um idílio permamente, apesar de toda a beleza de ambas cidades.QQ um que pega o metrô entupido em horário de rush, seja no Rio ou em Paris, sabe disso...

3.Ao contrário dos brasileiros (que sempre que encontram um gringo aproveitam a oportunidade pra tentar praticar até mesmo o pouco que sabem na outra língua e pouco se importam com a correção linguística e sim com o contato humano) os franceses, pouco importa de qual região da França, geralmente guardam um senso de dignidade linguística que os impede de sair imediatamente ousando numa língua estrangeira.Eles tb costumam ser bastante orgulhosos da língua de Molière, no que estou com eles e não abro! ( Adoro em primeiro lugar a minha última Flor do Lácio, inculta e bela, mas convenhamos....o amor à Lingua Portuguesa não é uma característica marcante no nosso povo como é nos franceses.)

A lição número 1 para o turista estrangeiro na França é : se aprender Francês seriamente não está nos seus planos- uma pena-pelo menos leve um guia de conversação daqueles de bolso e se arrisque! Se jogue! Não tenha medo, pagar mico em país estrangeiro é sempre infinitamente mais brando.E os franceses, mais do que qq outro povo que eu conheço, se sensibilizarão de uma maneira tocante com o seu esforço em se comunicar na língua deles.Todo e qq mico linguístico valerá imensamente a pena.

Falo com conhecimento de causa pois na minha primeira viagem à França eu não falava quase nada em Francês.Mas levei um guiazinho de conversação e só de sacá-lo e começar a gaguejar calamidades em Francês já sentia que imediatamente o Francês diante de mim começava a emanar fluidos de enorme boa vontade até, com meu esforço continuado, estarmos ambos com
pletamente imersos numa nuvem de empatia recíproca.E aí o Francês, por mais idoso que fosse e menos conhecimento da Língua Inglesa tivesse, até arriscava algo em Inglês do Inspetor Clouseau pra me dar um help...

Para vocês terem uma idéia de ordem prática, nessa primeira viagem ( duma época tão remota em que eu viajava com minha mãe e de excursão...), minha mãe quebrou os óculos e tivemos que ir às pressas na primeira ótica que avistamos: Optique Chambon em Nice.( andei gogglando e parece que a ótica ainda existe!!!) Naquela época, há tantos anos que tenho até medo de fazer as contas, me desculpem,tratava-se de uma pequena ótica familiar em que o próprio Monsieur Chambon nos atendia.Era um verdadeiro francês de filme que podia tranquilamente estar no casting do filme Julie & Julia contracenando com Meryl Streep: meia-idade,vestido de terno de cor sóbria, se não me engano até de gravada borboleta, com cabelos gomalinados do tempo do pré-gel, óclinhos, magro, narigudo, rosto anguloso.Pois bem, nas minhas tentativas desesperadas de comunicação, recorrendo ao pouquíssimo de francês que tinha de memória e ao guia de conversação, chamei o homem inúmeras vezes de Monsieur Jambon ( presunto em Francês.) No início ele ainda reagia corrigindo " S'il vous plaît, Monsieur Chambon, Mademoiselle.", até que, muitas macacacas linguísticas da minha parte depois, ele largou de mão e até já sorria quando chamado de Monsieur Jambon.Tanto que saímos da ótica felizes e alguns francos mais leves, deixando lá um exemplo do clássico supostamente carrancudo Francês nos acenando tchauzinho com ar sorridente.

( Como esse post já está grande demais, vou parar por aqui.Aguardem a parte 2, onde pretendo falar mais especificamente do filme...Isso se não me perder novamente em minha memória-afetiva-francesa...rs)

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