"O mundo trata melhor quem se veste bem"

Um dos comerciais que mais marcou a minha infância foi um das camisas USTOP.Nunca mais me esqueci do slogan: " O mundo trata melhor quem se veste bem."Não que eu tenha absorvido imediatamente essa frase, muito pelo contrário: me rebelei contra ela anos a fio.Continuando a série " meus preconceitos confessáveis", admito: sempre tive um preconceito às avessas, contra justamente as pessoas que se vestem bem, e mais ainda contra aquelas que se vestem bem demais!


http://www.youtube.com/watch?v=rKYjC621jhw


O " se vestir bem demais" na minha infância, adolescência e pós-adolescência imediata era facilmente detectável: quem parecesse ter levado muito tempo tanto no processo de decisão do que vestir, como no processo de se arrumar para sair de casa.Adolescente dark, sempre olhei torto praquelas meninas muito bonequinhas, vestidas em tons pastel, com sapatinho boneca, bolsinha e cintinho "combinandinho" na mesma cor ou num ton-sur-ton.Na minha interpretação daquela época,pareciam pessoas frívolas, superficiais e burrinhas. Como nunca me identifiquei com tais " valores", me esforcei ( inconscientemente, of course) pra ir no sentido oposto: o das pessoas que fazem questão de não ligar muito para o que vestem.Ligava minimamente, claro, procurava seguir alguns códigos dos lugares que frequentava, mas sempre com um ar de " francamente, tenho mais o que fazer do que me preocupar com a minha imagem."Não me perguntem de onde surgiu essa minha teoria,o fato é que ela surgiu, se enraizou em mim e passei anos sem jamais questioná-la.


Inúmeros anos depois, bem mais do que eu gostaria que fosse, comecei a mudar.A rebeldia adolescente deu lugar à razão.Comecei a perceber que não dá para prescindir do poder da própria imagem.Mesmo que vc não ligue realmente ou diga que não liga, não tem como controlar o quanto quem está à sua volta liga.Roupas e imagens são códigos de aceitação ou reprovação social, quer gostemos ou não.Mesmo quem não liga para o que veste mesmo assim continua passando uma imagem.Ninguém pensa: " Ah, o fulano?! Ah, ele tem preocupações maiores, vamos dar um desconto.Esse sapato dele não vê graxa há anos, o modelo e cor da camisa não tem coerência alguma com a calça, mas olha...ele é uma ótima pessoa!" O problema é que para saber que ele é uma ótima pessoa, preciso ter contato com ele.E, muitas vezes, só pelo código visual que as pessoas ostentam, mesmo que involuntaria ou inconscientemente, nos afastamos- ou nos aproximamos-delas.


Claro que esses códigos podem ser enganadores! Um motociclista-roqueiro-cabeludo vestido de preto, com piercing no supercílio e cheio de belas tatuagens pode ser na verdade um sujeito pra lá de entediante, mais conservador do que minha avó de quase 90 anos, enquanto aquele outro ali com camisa quadriculada, óculos redondo fundo de garrafa e cara de Bill Gates nos anos 80 pode ser a conversa e a vida mais interessante da cidade!O problema é que, como tanto nosso tempo como nossas possibilidades de interação social são limitadas, terminamos, pelo menos num primeiro contato, julgando pela aparência.É bem aí que mora o perigo de nunca nos aproximarmos de pessoas verdadeiramente legais por tomar por base as aparências.


Não dá para decidir não ligar a mínima pra aparência alguma nunca, a vida seria um inferno! As aparências servem pra mapear, mesmo que minimamente, e por vezes erroneamente, as pessoas.E isso nos dá uma certa segurança, mesmo que falsa.Quando subo num ônibus e vejo um sujeito uniformizado no banco do motorista, entendo que ele é o motorista.Se ele estivesse sem o uniforme, vestido de bermuda surfista e sem camisa, eu não ficaria tranquila.Quando marco um médico que escolho pelo livro do plano de saúde, chego lá e vejo um cara vestido de jaleco branco me estendendo a mão, aquilo me tranquiliza que é realmente um médico.Se chego num consultório médico e vem um sujeito me atender vestido de preto dos pés à cabeça, não vou me sentir muito a vontade, mesmo que ele seja o melhor médico da região.Ou seja: no mundo não basta ser, é melhor ser e aparentar.


Socialmente procuramos quem nos parece mais interessante ou quem, pelo visual, parece ter uma identidade conosco.E nessa, fatalmente, muita gente boa se perde.


Já falei disso aqui no blog, mas adoro falar de novo! Uma das minhas amizades mais próximas e atuantes não foi com a cara da minha " imagem" de início.Não rolou identidade, ela achou que não teria nadica em comum comigo, que eu não seria uma pessoa interessante.Rárárá, ela estava ERRADA! rs Já me perguntei quantas possíveis ótimas amizades ( e até " algos-mais" em outros casos) eu teria perdido por causa dessa imagem antiga.


Seja qual fôr a imagem, tanto a antiga ( qdo eu não dava muita bola pra imagem) quanto a nova ( onde declaradamente me importo sim com a aparência), cada uma afugenta um certo número de pessoas e atrai outras tantas.Um bom exercício é perceber que imagem constroem a seu respeito pessoas que nada sabem sobre você.Não sabem onde você mora, qual seu nível de instrução, quais seus valores,se vc é casada ou solteira, mãe ou não, como são seus relacionamentos principais, qual é a sua profissão....e mesmo assim, meramente com base na aparência, vão te avaliar.Adoro o feedback dessas pessoas, é sempre muito interessante.Algumas vezes me divirto adiando respostas sobre mim justamente para perceber que imagem eu transmito só pelo meu visual e jeito de falar.(O exercício fica mais divertido qdo se está em outro país e aí as pessoas ainda vão ter que descobrir minha nacionalidade pela minha aparência e sotaque.A resposta mais escalafobética que já ouvi foi de um motorista de taxi de uma ilha da Bretanha, um lugar onde certamente não aparecem muitos brasileiros, que sapecou que eu devia ser das Ilhas-Reunião, um departamento Francês lá no Oceano Indico! rs

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