Mentira adulatória

Recentemente temos discutido a MENTIRA na comunidade Simplicidade Voluntária do orkut. http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=2298970


Marcella, uma das participantes mais ativas, lançou várias perguntas ao grupo que respondi assim:


1.Vcs convivem bem com a verdade?




R:Não digo que convivo bem com a verdade 100% pq muitas vezes ela dói e é indigesta.Mas prefiro a verdade do que me basear na mentira, criando um castelo de cartas e ser difícil mais tarde.




2.Gostam dela ou preferem uma mentira saudável?


R:Depende novamente.Qdo é uma relação privilegiada de amizade ou amor, prefiro a verdade.Para outros tipos de relação, muitas vezes a mentira saudavel é o melhor a fazer.




3.Ja tentaram passar um dia sem mentir, nem socialmente?


R: Nunca tentei, mas acho que já passei vários sem mentir.




4.Por que as pessoas se ofendem com a verdade e não com a mentira? Não seria isto uma imaturidade emocional?



R:Pq em geral é uma verdade dolorida.Se a verdade fosse " vc é mais linda do que a Gisele Bunchen" seria moleza, todo mundo lidaria bem! Essa verdade com as quais as pessoas se ofendem são geralmente as não lisonjeiras do tipo " essa roupa está horrível" , " você agiu irresponsavelmente", " não, eu não te amo e pra mim não dá mais"...rs Certamente que é imaturo não saber lidar com a verdade, ainda que indigesta.Mas que muita gente prefere mentiras palatáveis a verdades indigestas, ah, isso é evidente!



Dias depois de responder à essas questões, me lembrei de um aspecto ultra-importantíssimo da mesma questão: a mentira adulatória! Mentira adulatória é a suposta mentira-boazinha, a mentira que supostamente faz bem a alguém.( Não confundir com o não menos importante conceito da verdade-burra.Há gente que acha que a questão se reduz a meramente 2 opções: ou a verdade burra, ou a mentira adulatória.Eu defendo que, entre esses extremos, há outras opções.Por exemplo: a omissão momentânea aguardando o momento e a forma mais oportuna.



Mentira adulatória é uma coisa irritante.Muita gente minimiza achando que " o que vale é a intenção." Papo furado, pra mim a inteção vale, mas não apenas ela.Dando um exemplo mega-exagerado, posso ter tido a intenção de salvar vidas mas se, por incapacidade ou imperícia minha, apesar das minhas ( supostamente) elevadas intenções, causo um acidente com mortos, feridos e vários danos a terceiros, tenho que responder por isso.Certamente que há um atenuante entre nesse caso, se eu conseguir provar que sou mesmo uma topeira bem-intencionada, e um agravante no caso de uma pessoa que por maldade, de caso pensado, voluntária e planejadamente vai lá e causa o mesmo acidente, mas não tem essa de puramente " o que vale é a intenção" pq, como já bem respondeu a própria sabedoria popular, " de boas intenções o inferno está cheio!".



A mentira adulatória é usada para vários fins, humanitários ou egoísticos.Algumas até são válidas.Vc não vai dizer para um doente terminal " É, acho mesmo que vc está acabado, dessa você não escapa." Nesse caso, considero pra lá de aceitável.No entanto, é fato que a maioria absoluta das mentiras aleatórias causam algum tipo de prejuízo.E váaaarias dessas mentiras são contadas, não por motivos humanitários e sim pensando-se no próprio umbigo.



Uma época da minha vida engordei muito e não conseguia emagrecer de jeito nenhum.Fiquei gorda e lutando contra isso, algumas vezes mais e outras menos, por vários anos.Muitas vezes, em épocas plenas de orgias alimentares, topava com alguma pessoa que sapecava: "Ah, você está mais magra!" Eu tinha vontade de dizer: " Meu amigo, magra como se comi uma caixa de bombom sozinha hoje, ontem 2 mousses e 2 quiches, anteontem um litro de suco de laranja...?! Que tipo de droga vc está usando?! LSD, além de fora da lei, está tão fora de moda...." Juro pra vocês que isso acontecia com frequência: a balança não acusava um quilo sequer a menos, minhas roupas todas apertadas, eu vestindo uns 3 manequins a mais do que meu habitual,comendo feito a Magali...e as criaturas tendo a ousadia de me dizer que eu estava mais magra!!!!



Socialmente já peguei algumas pessoas no flagra.Estou na companhia de alguém e chega uma outra pessoa no recinto.Meu interlocutor elogia efusivamente a pessoa que acaba de chegar.O elogiado fica visivelmente todo feliz, com sorriso de orelha a orelha e depois sai.Eu acho que há um considerável exagero no elogio feito, me viro para o interlocutor e pergunto: " Puxa, realmente, vc acha isso tudo?!" e ele responde: " Ah, não é isso tudo não, mas você viu como a pessoa ficou satisfeita?!" como quem pensa: " Eu fiz minha boa ação de hoje, ajudei uma velhinha a atravessar a rua ou dei o lugar pra uma grávida no metrô.Como mamãe ensinou..."


Ora,gente, francamente, chamo isso ( não o ajudar a velhinha e nem ceder lugar para a grávida), esse elogio fictício de " induzir o outro em erro". Se a pessoa está toda feliz com uma calça que veste mal pra ca-%$#@$ vou ficar na minha, não vou dizer " Puxa, adorei essa calça, onde vc comprou?!" Se não tenho intimidade com a pessoa e ela está toda contente com a calça, não vou dizer " puxa, que lixo de calça, como vc está feliz com uma droga dessas que veste pior do que um saco de batatas?!", mas mentir dizendo espontanea e deliberadamente que gostei, é sim induzir ou contribuir para continuar mantendo a pessoa num erro.( Claro que há situações clássicas como a da mulher que sabe que engordou e vira pro namorado perguntando " Vc acha que engordei, amor?!" Na verdade ela sabe que engordou, a balança, o espelho e as calças do armário já disseram isso pra ela.Na verdade, na sua maioria, as mulheres que perguntam isso não querem saber a verdade, querem afago.Tem gente que nunca está a fim da verdade a menos que ela seja palatável.São os que ouvem com prazer um " nossa, vc emagreceu!" com prazer e sorriso nos lábios mesmo sabendo que estão na TPM e retendo líquidos horrivelmente, então o elogiador ou é absolutamente desligado daqueles que não percebem nem 10 quilos de diferença ou uma rapunzel que corte o cabelo, ou claramente é uma mentirinha supostamente do bem.



Há anos atrás eu ainda argumentava com o elogiador " nossa, que maravilha, ainda bem que vc me vê assim, mas sabe, a balança na verdade me disse que estou 4 quilos mais gorda e essa semana comprei uma calça de um manequim maior!" Depois, qdo percebi que as pessoas ou são completamente avoadas ou elogiam como quem acha que faz uma boa ação pra levantar nosso moral, parei de reagir.Ainda mais quando não tenho intimidade com a pessoa, me limito e sorrir e a agradecer.Posso ouvir " Nossa, vc está tão bem!" mesmo que eu tenha passado noites em claro, esteja na TPM e moralmente esteja me sentindo a mosca do côco do cavalo do bandido.Ou aquela pessoa não me enxerga realmente, não percebe minhas oscilações de bem-estar e aparência, ou claramente acha que estou tão mal que preciso de um botox na auto-estima.E ainda acha que mentiras adulatórias tem esse poder.



Na verdade, acho que todo ser humano razoavelmente equilibrado tem de ser capaz de estabelecer uma auto-escala razoavelmente honesta de avaliação.Estou dando exemplos físicos, de olheiras ou quilos a mais pq são os mais óbvios a olho nu.Mas essa auto-percepção deve se aplicar não só a coisas físicas como a aspectos emocionais, virtudes e defeitos da personalidade, méritos e fracassos.Pode ser em qq campo da vida, inclusive no profissional.Posso achar que não fiz um trabalho bom, mas o cliente pode ficar satisfeito.Posso fazer um trabalho honesto e o cliente não gostar.Tenho que ter consciência dessas nuances e não me permitir ficar numa gangorra emocional controlada por terceiros.



Por outro lado, a questão é plena de sutilezas.Há também diferentes percepções da realidade de acordo com o nosso estado de espírito, nosso olhar, nossos padrões, nossos referenciais e nossas experiências anteriores.Posso estar me sentindo feia e encontrar alguém de forma franca, sem demagogia alguma, me elogie.Posso, por outro lado, estar num espírito total da música Perigosa, das Frenéticas, e dar com meus burros ( todos) n'água. http://letras.terra.com.br/as-freneticas/65222/ Como diria Betobelê: Doidera, doidera, doideeerrrraaa! rs




Mui provavelmente a verdade de precisão milimétrica e absoluta não exista pq depende de pontos de vista, de aspectos da questão, do ângulo pelo qual se observa, da experiência pregressa de quem avalia.Como aprendi nas aulas de Física do colégio, tudo depende do referencial...mas para sermos autônomos, temos que ter uma idéia o mais apurada possível dos nossos méritos físicos, emocionais, relacionais, profissionais para evitar ficar ao sabor da correnteza....É preciso saber nadar no mar e isso inclui saber quando ficar boiando despretensiosamente, quando não exaurir energia preciosa resistindo a uma correnteza mais forte e até nos deixar levar conscientemente por alguns metros , quando resolver nadar vigorosamente pra sair de um valão, quando aproveitar a onda para chegar à arrebentação, quando entrar e quando respeitar a bandeira vermelha dos salva-vidas....




2 comentários :

Gustavo Gaspar disse...

Vc já viu o filme "O mentiroso" com o Jim Carrey? Parece uma comédia boba, mas na verdade é , na minha opinião, um verdadeiro tratado sobre o papel da mentira na nossa sociedade.Vale a pena assistir!
Há quem diga que ela é um apaziguador soial, e que a vida em sociedade seria insustentável sem ela...
Meu pai gosta de dizer que existe aquela "mentirinha carioca", aquela leve, e que não prejudica ninguém, tipo: Cheguei atrasado por que peguei o maior trânsito! Ou ainda: Pô, te liguei, mas o seu telefone só dava fora de área!!! Kkkk!!!

Taimemoinonplus disse...

Oi,Gustavo! Ainda não vi " O mentiroso". Acho que vou conseguir lá pra 2012! ( Depois daquele western do Clint, comecei a ver Alcatraz há umas 3 semanas.Dei um pause e nunca mais voltei...rs (Estou lutando contra a minha resistência de ver filmes em dvd, pra mim poder dar o pause tira muito da graça do filme e desanimo...