Efeito manada



Não quero que esse blog vire um clube da Luluzinha, mas me desculpem: hoje PRECISO falar sobre esmaltes.

Desde que nasci, há 35 anos, o mainstream das mulheres brazucas sempre usou esmaltes clarinhos, tanto nas mãos como nos pés. Nos pés, sobretudo porque mulher brasileira sempre teve urticária de pintar unhas dos pés com cores escuras. As manicures sempre tiveram 3 vezes mais variações de clarinhos do que de escuros em seus estoques.Os “ vermelhos” ( que era como chamavam genericamente TODOS os esmaltes escuros), tinham bem pouca saída.Vez por outra alguma tia velha de unhas compridas ou alguma mulher mais arrojada usava um.

Enquanto isso, na gringolândia, as mulheres gostam de escuros nos pés não é de hoje.
Eras depois, as brasileiras que antes prefeririam cair da escada de costas a ter as unhas dos pés pintadas de vermelho, começaram a se sentir tentadas a ousar. Começaram timidamente tentando e fazendo cara feia.Pedindo pra manicure pra tirar e recolocar os misturinhas.A indústria continuou bombardeando como sempre, mostrando as estrelas de Hollywood e do mundo da música usando cores que fugiam do clarinho incolor, inodoro e insípido.Aqui no Brasil as novelas continuaram os bombardeios, com atrizes globais usando esmaltes não-clarinhos.Só aí então, finalmente, as coisas mudaram.Se colocarem a mocinha da novela das 8 usando papel higiênico usado como parte da indumentária, é capaz de vender!

A mudança não foi natural, foi desesperada: um frenesi grupal tão doido, um verdadeiro surto feminino coletivo que chega a ser patético. Hoje em dia ir na manicure e pedir um esmalte clarinho é praticamente um crime.Os clarinhos foram deixado de lado e os balaios das manicures deixam o arco-íris parecendo uma combinação monótona de cores: incontáveis variações do vermelho ( vermelho sangue-fresco, vermelho sangue-coagulado, vermelho-tomate, vermelho-paixão, vermelho deixa beijar, vermelho Ivete Sangalo, vermelho ***!), variações absurdas de rosa, de corais e ultimamente variações inacreditáveis de cores néon variadas (abóbora comlurb, amarelo flúor, rosa Pink de doer as vistas...) e até impensáveis variações de cores antes relegadas do mundo dos esmaltes como verdes e azuis.Como aparentemente não tinha mais nada a ser inventado entre cintilantes e cremosos de todos os matizes, criaram os foscos e um pós-esmalte que tira o brilho de qualquer esmalte.( Já havia previamente um outro produto chamado extra-brilho, que dá brilho a qualquer esmalte.)

Outro dia vi uma senhora na manicure, a pedido da filha que ia casar no dia seguinte, experimentando um esmalte verde-musgo cintilante para combinar com o vestido durante a cerimônia. Felizmente ela se deu conta que aquele esmalte ficaria bem na Kate Moss num editorial da moda, mas não numa respeitável senhora de uns 60 no altar de uma cerimônia de casamento estilo pátria-família-sociedade. Infelizmente muita gente não tem esse discernimento, até porque é difícil mesmo resistir ao apelo coletivo: praticamente todo mundo usando e a gente vai se des-sensibilizando e achando que aquilo é pra todo mundo.Não é questão de idade, é também uma questão de estilo, de quem se é e se as novidades são compatíveis com o kit da obra.A Elke Maravilha por exemplo, pode fazer 80 anos, que sempre vai combinar com qualquer cor de esmalte escalafobética que seja bolada pela infindável criatividade humana.

As empresas de esmaltes estão alucinadas, lançando compulsivamente cores e coleções novas no mercado. Impossível conhecer todos os lançamentos, já vários blogs foram criados só para tratar de esmaltes ( coisa impensável no tempo monótono do binômio misturinha ou vermelho-praticamente-único.) O pior: lançam muita porcaria no mercado: esmaltes com péssima cobertura, que descascam no dia seguinte ou que exigem uma paciência de Jó porque só ficam com cobertura aceitável na terceira camada! As manicures andam reclamando que tem esmalte demais a venda, mas muitas vezes as cores com cobertura verdadeiramente homogênea não são achadas nos pontos de venda.

Criam essa infinidade de cores, muitas delas ruins, pra se criar o desejo do consumo. Antigamente, quando era só misturinha ou vermelhão, as mulheres precisavam de bem pouco pra saírem realizadas e confiantes da manicure.Hoje em dia a coisa vai num ritmo tão frenético que não raro a mulher que não sabe que “ sereia” é um verde-água se sente um peixe jurássico de profundidades abissais.

2 comentários :

Fabiola Paschoal disse...

Nossa, não poderia discordar menos!
Não tenho a menor saudade de quando não tinha opção no mercado, e é MUITO chato usar só as mesmas cores "nhé" de sempre, tipo rendas e vermelhos e afins. Eu, que sempre gostei de coisas diferentes, me sinto muito mais confortável agora, com a facilidade de encontrar esmaltes de cores diferentes do usual. Pense mais fora da caixa, menina. Vc deve ser de uma profissão que não te permite ousar muito em cabelos, unhas, maquiagem, roupas... tente dar uma repaginada pra ver como é bom!

Não me considero uma vítima do "consumo desenfreado" que vc cita no post, ao contrário, n sigo a moda, uso o que quero e o que gosto. Mas não me importo com as cores "exóticas" de esmaltes estarem em voga: assim, fica fácil encontrar opções. Felizmente, hoje em dia, nós estamos virando maioria. :)

Taimemoinonplus disse...

Fabíola:

Outro dia falei com uma mulher que sempre gostou de esmaltes de cores exóticas. No tempo que isso não existia, ela dava seu jeito usando ingredientes mais exóticos ainda, como tinta de caneta bic misturada em outro esmalte. Gente arrojada assim sempre existiu e vai continuar existindo. E felizmente!

O mercado que cria artificialmente esse excesso de necessidades, algumas pessoas podem desde sempre terem tido gosto por itens exóticos, mas não é o caso da maioria. De uma hora pra outra, porque injetam mil versões que não existiam e sapecam todas as celebridades usando isso, mesmo as mulheres de gosto não-exótico sentem praticamente a obrigação de acompanharem a onda, sob pena de se sentirem jurássicas. Na minha opinião, é preciso ter uma baita personalidade pra não seguir o caminho da maioria.

Uma amiga que sempre curtiu o visual rocker anda danada da vida pq, já que o estilinho está em plena moda, praticamente não se vê outra coisa por todos os lados.Para ela é como se fosse uma apropriação indébita, entende? Peraí, ela era roqueira, de uma hora pra outra o mundo virou rock n’ roll?! Sabemos que, qdo a moda passar, muita gente vai deixar de usar porque isso não encontra eco na forma de ser da pessoa, só estão seguindo uma tendência controlada 100% externamente.

Aparentemente termos mais opções é uma maravilha, mas ter opções demais também pode virar problema. Outra amiga foi fazer a unha na manicure e pediu um esmalte vermelho do mais tradicionais.A manicure fez cara de horror e falou: “ Até tenho, mas cruzes, ninguém mais usa isso!” Hoje em dia está quase se instituindo nas manicures uma obrigação de ousar e ser “ moderna”. Quem quiser ser “careta” não pode mais fazê-lo em paz. E por trás disso, claro, tem toda uma indústria que estimula que nossas necessidades sejam maiores pra nos venderem 300 vezes mais coisas.

Considero um privilégio poder trabalhar num estilo de empresa que te dá a liberdade de usar a roupa que bem entender, ter tatuagens e piercings em locais visíveis, pintar o cabelo de rosa com laranja. Mas infelizmente a realidade ainda é bem diferente. Outro dia uma caixa de uma farmácia de rua me explicou que tinha que usar um curativo pra cobrir seu piercing do nariz durante as horas de trabalho... Outra amiga que trabalha em banco disse que nenhum dos funcionários pode ter piercing ou tatuagem aparente...fico achando que, num mundo ainda com tantas restrições no mercado de trabalho, o auge da rebeldia que talvez ainda reste para algumas seja usar por alguns dias uma cor de esmalte diferente, mesmo assim porque existe uma panacéia chamada acetona!