Garotas que bebem

Durante a Copa do Mundo, em meio a todos aqueles feriados informais forçados em dias de jogo do Brasil, o Ivan Martins da revista Época escreveu um interessantíssimo artigo intitulado “Garotas que bebem”. Vale uma gogglada, e como vale.

Segundo ele, de acordo com estatísticas do Ministério da Saúde, para mulheres quatro doses de bebida numa mesma ocasião são consideradas abuso (para homens cinco doses.). Apenas ultrapassei essa cota de caso pensado em jantares românticos em locais privados. Uma só vez devo ter ultrapassado em público, de forma não deliberada, em férias de adolescência num inverno rigoroso do Sul de Minas. Jovem demais, frio demais e conhaque demais. Fiquei mais falante do que meu normal e só me dava conta do que estava falando no meio, ou no fim da frase. Acho que fiquei chata e, como estava com uma grande amiga e o namorado dela, temi que tivesse falado mais do que devia.Depois me disseram que não cheguei a causar nenhum constrangimento, mas pra mim já é constrangimento suficiente não controlar as palavras que saem da minha boca ou, pior ainda: nem lembrar delas.

Não sigo nenhuma religião que proíba a bebida, aprecio experimentar bebidas novas, adoro uma refeição regada a vinho, mas, para os padrões nacionais, sou considerada praticamente uma freira Carmelita com relação à bebida. Meus amigos e conhecidos já sabem, muitas vezes vira até motivo de piada o fato de ou não beber nenhuma dose ou beber muito comedidamente em reuniões sociais.

Com bebidas, ajo como com chocolate: aprecio mesmo, então não me dêem chocolate entupido de gordura vegetal assim como não esperem que eu ache graça em beber uma latinha suja e quente de cerveja. Sou do tipo chato, confesso, que entre beber cerveja em copo de plástico e ficar só na água, escolhe sem pestanejar a segunda opção. Bebida pra mim, como chocolate, é um ritual e não uma coisa banal.Isso me ajuda, assim como o fato de não apreciar beber/comer de pé, a beber pouco ou quase nada.Mas parece que a maioria não se importa e com isso e assim fica fácil ultrapassar 4 ou 5 doses cotidianamente.

Outra coisa que me ajuda a beber menos é justamente adorar comer e comer muito. Comer e beber com o mesmo entusiasmo levaria minha circunferência a proporções inaceitáveis, logo escolho firmemente o garfo ao copo. A Lei Seca que se abateu sobre o Rio pouquíssimo me abalou. A única coisa chata agora é ser obrigada a entrar em filas para soprar bafômetros, coisa que JAMAIS tinha me acontecido em década e meia como motorista habilitada.Desconcertante e patético ter que soprar um troço de plástico que vai aferir minha capacidade ao volante sob o olhar atento de um clube do Bolinha oficial.

Bom, mas sou exceção. A maioria gosta de beber bastante publicamente (chamam de socialmente) e para essa maioria grande parte da diversão da noitada daí advêm. Realmente pode ser bastante chato estar muitas doses de distância de uma maioria que já aumentou o tom de voz, já fala arrastado e faz declarações de afeição a quase-desconhecidos. Pode ser como estar de corpo presente numa festa pra qual não se foi convidada.Mas isso é opção.Não por ser abstêmia ou por não gostar de bebida, mas por poder escolher quando estou a fim de beber ou não, sem ter que beber porque é ocasião pra beber. Normalmente não se dá às pessoas essa liberdade, vão logo te colocando um copo na mão e enchendo-o automaticamente toda vez que o nível desce um pouco. Suspeito que isso seja considerado cortesia, amabilidade, camaradagem... E também é com camaradagem que brincam com você dizendo “Puxa, vai parar, vc é fraca, hein?”!”ou” Putz, não vai beber?!”

Com toda essa praxe social, o que acontece? As mulheres andam bebendo cada vez mais, algumas vezes até como homens. O que elas tem a ganhar? Absolutamente nada, nem mesmo provar que tem os mesmos direitos deles porque isso, apesar dos sutiãs queimados e muita gritaria, não têm mesmo. Podem até ter da boca pra fora, “pra Inglês ver”, na mesa do bar, mas dentro das mentalidades e off the record a coisa é bem diferente. A sociedade brasileira adora posar de liberal, mas no fundo é de um tradicionalismo colonial. Podemos evoluir socialmente sim, mas a equiparação dos sexos não é um alvo possível e muito menos desejável. Lastimável que muitas mulheres se esforcem para se equipararem aos homens muitas vezes no que eles fazem de equivocado. Nosso organismo é mais sensível à bebida, somos mais frágeis fisicamente e socialmente mais expostas. A prova é que um homem e uma mulher completamente bêbados jamais serão vistos pela platéia com os mesmos olhos e jamais terão o mesmo julgamento.

7 comentários :

Paulo Tamburro disse...

OLÁ,
recentemente escrevi no meu blog de humor,"Humor em Textos" - para o qual você já está convidada a dar uma passadinha por lá - uma crônica cujo título é:

"DAS BOCAS, DO SEXO ANTROPOFÁGICO E OUTRAS COMILANÇAS".

O viés adotado, não foi exatamente, o quanto as mulheres e os homens andam bebendo, e as mulheres realmente, estão extrapolando, e sim, o que ambos comem junto com o que bebem e os beijos fatídicos na boca que acontecem nos intervalos (rs).

Fala sério!

Quanto as minhas felicitações, podes crer que não só para OGlobo, mas para outros jornais e revistas mandarei e-mails de elogios ao seu blog, que realmente é muitissimo bom.

Pretendo voltar sempre.

Um abração carioca!

Erika Pessôa disse...

Eu li este artigo, é, legal mesmo!
Quanto a bebida, viemos do mesmíssimo planeta :D

xero!

Taimemoinonplus disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Taimemoinonplus disse...

Paulo:

Obrigada pelos elogios! :-)
Vou " estar passando" no seu blog! hehe ( adooooro telemarketinguês!)

Erika:

Xeros!!!!

Paulo Tamburro disse...

Taimemoinonplus,

seus comentários nos meus textos, superam em muito - e sem nenhuma demagogia - os objetivos deles.

Você os torna, muito maiores, profundos e interessantes.

Sua visão crítica, dá o acabamento perfeito, àquele ponto que faltou, no texto original.

Por tudo, continue a comentar com esta precisão extraordinária.

Obrigado, mesmo e muitos abraços deste carioca, que está mais feliz do que pinto no lixo, com sua presença inteligente e construtiva.

Rart og Grotesk disse...

beber é bom, mas claro que tudo tem o seu limite. De vez em quando, nem percebemos e exageramos na dose. É de gota em gota que ficamos tontas e sai bobeira da boca...
gostei do seu blog, se quiser acesse o meu http://artegrotesca.blogspot.com.
vou te seguir! bjos

RM disse...

Ola,
Obrigada por compartilhar suas idéias. Achei o tema do post interessante, mas fiquei confusa se ali se falava sobre alcoolismo, hábitos femininos quanto à bebida ou feminismo.

Compartilho muitas das suas impressões, mas fiquei chocada que mulheres fossem identificadas como "frageis fisicamente". Não dá pra atribuir a um genero qualificação de frágil ou nao sem levar em conta estrutura física individual. Esse conceito é um pouco relativo quando pensamos na transformação física que ocorre para uma mulher gerar e dar à luz um bebê.

Dei uma olhadela no artigo que vc mencionou, e achei que o autor fez seu ponto sobre os excessos, porem tambem me deixou confusa sobre o foco do artigo quando criticou somente mulheres por não mudarem seu hábitos - um tanto machista a meu ver. "Tenho visto as pessoas deixarem de fumar e passarem a fazer esportes. A dieta tem mudado tão radicalmente que muitos de nós se tornaram vegetarianos ou quase isso. Mas poucas mulheres ao meu redor deixaram de beber." => primeiro falou de 'pessoas', o que é bem generico, e depois se referiu à 'mulheres', levantando o ponto negativo. De repente escolheu um grupo pra apontar como mal exemplo? Então de repente é muito feio que somente mulheres não tenham mudado seus hábitos!? Beber excessiva ou socialmente faz parte do direito de exercer livre-arbítrio. Livre-arbítrio existe pra quem queira o bem como também para quem quer o mal (e a discussão sobre o que é mal vai longe também).

Bem, generalizações sobre mulheres ou homens ou de qualquer outra clase não é necessariamente justa. Se estamos aqui falando contra o alcoolismo, ergo minha taça de vinho e faço um brinde à este artigo! rs